domingo, 20 de setembro de 2009

A Lança, A Carne e A Rocha

Engraçado eu pensar sobre a minha adolescência, momento em que eu amei de forma mais sincera e destemida... mas, mesmo na adolescência, eu percebi que o amor era pra mim como uma lança que se enfiava na carne. Como poderia uma pessoa amar e deixar de amar assim, se o amor era essa lança, que apontava certeira no coração e fazia sangrar tanto?

Amei, amei profundamente. Duas garotas, uma em um momento diferente da minha vida. A primeira foi a minha melhor amiga - hoje eu a entendo assim, pois ela me tratou com a seriedade necessária para tal sentimento e jamais me iludiu, por mais que eu pedisse. A segunda foi a tentação da carne que, em seguida, se mostrou um espinho envenenado.

Porém, nenhuma das duas foi propriamente aquela lança que eu imaginei penetrando o meu peito... Eu cheguei a achar que isso não existia, que o amor era simplesmente aquela volúpia frívola que eu tanto vi - e participei - nos meus dezesseis anos. Porém, não mais que de repente, eu senti dois olhos enormes, de lança, me atravessando sem piedade numa aula de Criação Literária.

Juro, eu não acreditei. Achei até que aquilo fosse normal, que eu estaria diante de mais uma simples interação corporal... mas, ao mesmo tempo, algo estava muito diferente. Por que esses olhos de lança? Não, não eram de lança... eram de mar, verdes e límpidos, revelando a ponta de um iceberg que eu só via nos meus devaneios. Um iceberg cravado, como uma lança, em alto mar.

Arrisquei. Abri o meu peito para mais essa estocada. O meu espanto em saber que você também me queria desta maneira foi algo inexplicável. É como se a fenda do meu peito fosse preparada sob medida para te receber, e você também. O milagre do amor aconteceu, e eu estava acordado para ver.

Com ele, vieram também todas as dificuldades que um grande amor costuma enfrentar... e nós enfrentamos com muita coragem - tá, nem sempre fomos corajosos assim, mas a gente sustentou um ao outro nos momentos mais difíceis, durante os três anos e quatro meses do nosso laço. E vieram também a magia, a alegria e o gozo de todos os momentos felizes que passamos juntos.

Porém, eu não esperava que tudo fosse acabar. Pra mim o amor é como uma lança que se enterra na carne e deixa uma fenda que ninguém consegue mais preencher. E você... você quis ir embora, não aguentava mais a angústia de escolher entre o meu amor e o da sua pequena. E você foi. Mas não sem antes remexer a lança enfiada no meu peito, forçando para uma cicatriz ainda maior.

Eu não consegui deixar você ir embora. Eu enrijeci a carne; tornei-me rocha. Hoje, nenhum amor é grande ou forte o bastante para me tornar carne viva novamente. Porque eu hoje sou rocha que não deixa mais nenhuma lança me perfurar... ou sair. E eu fiz isso só pra não te deixar ir embora... de dentro de mim.

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